29 de jan. de 2010

E descansou no sétimo dia

-João Mammana

Eu sou um vulcão ativo. Instável, paranóico, imprevisível. Sou um motor superaquecido. Gasto, estressado, sem controle. Mastigo a tristeza, engulo a frustração, revolvo a raiva e cuspo sangue. É tanto café, cigarro, remédio, cachaça e o caralho à quatro que dificilmente ajo conscientemente. É tanta raiva que me dá sem razão que espanco meus móveis e paredes até rasgar os punhos e quebrar meus dedos. E aí eu choro mais e mais. Bato a cabeça em quinas tentando morrer, mas elas não me deixam. Só me machucam o bastante pra eu não morrer e não poder bater de novo. Se o telefone toca, tenho medo de atender. Tentei me matar à americana, ligando o carro na garagem para sufocar com os monóxidos, dióxidos, foda-se. Nada, não tenho uma garagem de americano. Só consegui acabar com a gasolina. Apoderado de uma faca, cortei o punho, mas fiz errado e não acertei minhas veias. Pelo menos acertei nervos, pois não consigo mais fechar a mão. A televisão não liga desde que eu enterrei meu pé descalço pela tela. Me cortei inteiro tentando tirar ele de dentro da estúpida carcaça. Arremessei contra a parede um a um dos pratos que minha ex-mulher deixou em casa. Tentei rolar nos cacos como Iggy Pop fazia em shows e só fiquei mais nervoso. Queimei o meu almoço quando senti fome e estourei o fogão com um taco de golfe que a minha ex-mulher deixou em casa, herança do pai imbecil dela, que amava golfe. Golpeei minha cabeça com o taco umas vezes antes de atirá-lo para o meio da rua. Pedi uma pizza, só porque chovia muito e é inverno. Deixei o entregador plantado até ele ir embora. Não aguento sofrer sozinho. Mas quem é que quer compartilhar sofrimentos? Minha ex-mulher me deixou num dia como hoje, quando acordou com minhas mãos em volta do pescoço dela. Eu não queria matá-la, acho. Eu só não posso com a sensação de desalento perpétuo e a duração inesgotável de um dia como hoje. Num dia como hoje, tudo que me vem à cabeça é a auto-destruição. Nada que me digam pode ajudar. Nenhum passa-tempo faz o tempo passar. Eu quero explodir. Quero me unhar até não sobrar uma fibra grudada na outra.

Deus, onde Você estava com essa Sua cabeça de merda quando inventou o domingo?

Um comentário:

Clara disse...

meus dias auto-destrutivos parecem se concentrar apenas na mente, pois para mim um corpo é algo desprezível digno se se ignorar...
ou talvez seja apenas medo de transcender um mundo particular e deixar que outros percebam de mim através de um ato físico...
de qualquer forma gostei muito do texto, você descreve atos como em um filme noir, adorei isso. (: